Foi assim que um palestrante do primeiro encontro HIMSS do México descreveu o caminho para a transformação. Durante este evento, profissionais de destaque discutiram os temas fundamentais para o avanço da saúde digital no país: interoperabilidade, alfabetização digital, situação nacional atual, adoção de novas tecnologias e colaboração entre diferentes áreas do conhecimento. Veja também a gravação completa
Por Rocío Maure
No dia 7 de dezembro, ocorreu o primeiro encontro digital HIMSS México. A conferência virtual, que reuniu profissionais de saúde, tecnologia, representantes do governo e do setor privado, abordou temas fundamentais para a transformação digital do estado mexicano, como interoperabilidade, alfabetização digital, as lições da pandemia para o setor saúde e o estado atual da adoção de novas tecnologias. Como conclusão central, os palestrantes destacaram a necessidade de um prontuário eletrônico comum e de feedback entre profissionais de saúde e de tecnologia.
Grande parte dos expositores concordou com a importância de ter uma estratégia em nível estadual e a necessidade de gerar legislação e marcos regulatórios para acompanhar a transformação digital no setor de saúde. Nesta linha, o Deputado Nacional Éctor Jaime Ramírez Barba comentou que o processo legislativo começou em 2011, mas que hoje, 10 anos depois, foi apresentada a quinta versão da Lei de Saúde Digital, que o parecer aguarda aprovação da comissão.
As principais propostas do novo parecer contemplam interoperabilidade, serviços de saúde à distância, controle sanitário das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), prescrição médica eletrônica, software como dispositivo médico, além de estabelecer obrigações e direitos dos provedores e estabelecimentos de TIC. Por sua vez, o deputado destacou a necessidade de aprofundar a telessaúde para atendimento materno-infantil e os avanços nas leis previdenciárias.
O epítome nacional do impacto da implementação das TIC na Gestão Hospitalar é o Hospital Regional de Alta Especialidad de Ixtapaluca. Sua Diretora Geral, Dra. Alma Rosa Sánchez Conejo, afirmou que “este hospital inteligente é um investimento público-privado que tem como espinha dorsal a tecnologia digital”.
A Instituição funciona por processos e permite identificar os erros no atendimento, planejar e calcular o uso de insumos diários, reconhecer os maiores momentos de demanda (com o fim de contratar mais especialistas, por exemplo), conhecer o orçamento exato e saber quanto custa realmente o atendimento médico. “Temos mais de 450 leitos, dos quais 250 são censitários. Ter todo o hospital comunicado e integrar todos os processos é essencial para o nosso dia a dia”, explicou a diretora e reforçou que é preciso muita infraestrutura e profissionais qualificados para garantir que toda a governança seja em formato digital.
Além das possibilidades de cada instituição, um avanço tangível na saúde digital é a expansão da telemedicina. “No ano passado, foram realizadas 8 milhões de ações de telessaúde em 27 entidades federais (de um total de 32)”, explicou Adrián Pacheco López, Diretor de Telessaúde e Chefe da Direção Geral do CENETEC do Ministério da Saúde do México. Embora se observe um decréscimo em 2022, o objetivo comum é manter o número de ações pelas vantagens para os doentes, existindo cada vez mais coordenações institucionais orientadas para a telessaúde, com investimentos próprios, estatais ou externos para que o crescimento seja sustentado e contínuo.
“Hoje, os programas de telemedicina estão em praticamente todas as agendas de instituições nacionais e estaduais. As organizações estão se tornando mais flexíveis e têm uma mentalidade digital. Na medida em que nossos pacientes saibam que essas alternativas existem e que os responsáveis pelas políticas públicas possam ver na saúde digital um suporte para o cuidado, teremos mais possibilidades de que sejam incorporados ao dia a dia”, previu o funcionário.
Um antes e depois na transformação digital
Com base na experiência em primeira mão, representantes de diferentes organizações hospitalares concluíram que a pandemia mostrou que era necessário inovar e aprofundar os avanços na saúde digital. “Esta pandemia nos ensinou que não estávamos preparados, não tínhamos a infraestrutura ou os processos necessários”, lembrou Jaime Sánchez Ramírez, Diretor de Aplicações e Telecomunicações dos hospitais Angeles Health System.
Para resolver o desafio das atividades administrativas que não podiam ser realizadas remotamente, o grupo montou escritórios fora dos hospitais. “Instalamos equipamentos locais conectados a sistemas tradicionais, mas de outro local. Tínhamos que fortalecer os sistemas de informação e comunicação, era fundamental manter as redes Wi-Fi, a latência da rede, muitos aspectos que não se vêem, mas que são essenciais”, explicou e destacou que observaram uma mudança cultural que ajudou a dar continuidade ao negócio. «No momento, mantemos o trabalho remoto em um esquema híbrido e temos os blocos digitais para suportar novas tecnologias”.
Por outro lado, as organizações que já tinham alguma maturidade digital conseguiram responder melhor à pandemia. “Como desde o primeiro momento da pandemia pudemos oferecer orientação remota aos pacientes, passamos a atender pessoas de todo o país com alguns problemas logísticos devido à implementação dessas tecnologias em uma população que não estava acostumada a usar-las ”, resumiu o Dr. Alfredo Nacoud Askar, CMIO dos Hospitais Christus Muguerza, onde o hospital digital já estava sendo implantado no início da pandemia. Durante o qual implementaram o programa Covimed, um serviço gratuito de orientação médica que ainda está em vigor.
“Devemos estar preparados para dar uma resposta rápida, com médicos que saibam manusear os recursos tecnológicos que agora temos à nossa disposição”, concluiu o Dr. Nacoud (Christus Muguerza).
Hans Omar Sánchez Velarde, Diretor de Tecnologia da Informação dos Hospitais MAC, acrescenta que a segurança cibernética também é um aspecto crítico. “Devemos garantir que não somos vulneráveis, crescer em tecnologia e segurança. Temos que levar em conta que agora também estamos no foco dos investimentos”. Fruto da pandemia, o grupo MAC tem agora um plano de recuperação de desastres onde integram diferentes disciplinas, diferentes cenários para fazer simulações e ver como responder a futuras emergências.
Da mesma forma, a CIO do Centro Médico ABC, Andira Borgo, concordou que eles confirmaram o potencial da tecnologia por meio de ferramentas que integram inteligência artificial (IA), mas também destacaram um segundo grupo de aprendizado: “pelo menos na área de TI, queremos capitalizar sobre como as expectativas do consumidor-paciente mudaram, sua maneira de interagir com outras indústrias. Agora também existe a expectativa do paciente e isso muda a forma como a gente vai interagir com ele”.
Outro ator fundamental na resposta a emergências foi a Cruz Vermelha Mexicana IAP. Alejandro Muguerza Limón, Diretor Nacional de Mobilização de Recursos desta entidade, recordou que iniciaram a operação de resposta, que foi o maior destaque da Cruz Vermelha no México, e que implementaram «um sistema de telemedicina móvel que permite captar parâmetros vitais, gordura, glicemia, imagens de áreas específicas do paciente, eletrocardiograma e ultrassom, além de criar e carregar o prontuário eletrônico na nuvem”.
Um futuro previsível
Os provedores de soluções também desempenham um papel crítico na jornada para a transformação digital. Com base na experiência da Dedalus na Europa, Vladimir Mendoza, Managing Director de Dedalus Latinoamérica, destacou que «em nossa região seria importante aprofundar a área de saúde da população: estratificar o risco de determinadas populações, entender a possibilidade de eventos adversos, integrar essa população aos programas de prevenção. Assim, consegue-se um melhor manejo do paciente crônico e uma melhor detecção precoce.” Por sua vez, Mendoza recomendou priorizar a rede que conecta vários sistemas e vários profissionais, garantindo uma comunicação bidirecional com o paciente e adicionando recursos para usar as informações disponíveis e implementar a otimização operacional.
“Às instituições que estão nessa busca [da transformação digital], recomendamos que intervenham para melhorar a interoperabilidade entre os sistemas: incorporem ferramentas para esse fim e entendam a fundo os fluxos de trabalho para otimizar-los”, disse Vladimir Mendoza, da Dedalus Latinoamérica.
“A idade média e a expectativa de vida dos mexicanos estão aumentando, assim como as doenças crônicas”, alerta o Eng. Agustín Eduardo Harfuch Simán, Coordenador do Setor Saúde da TELMEX, “e precisamos de tecnologia para lidar com essas doenças”. Nessa linha, destaca a necessidade de gerar mecanismos para ter mais especialidades disponíveis em todas as regiões e ter uma liderança clara em nível nacional para integrar um grupo interdisciplinar com médicos, tecnólogos, médicos biomédicos e consultores, que gerem legislação e regulamentação necessárias para unificar a infraestrutura atualmente fragmentada.
“É importante que os avanços da saúde digital sejam aplicados a todo o sistema de saúde; o grande desafio é incorporar hospitais públicos a esta iniciativa”, acrescentou Tatiana Ardavin, Gerente de Vendas de Saúde México da Amazon Web Services, destacando que a AWS não está apenas no setor privado, mas também em hospitais públicos.
“A computação em nuvem pode ajudar a enfrentar os principais problemas atuais do setor, como eliminar a lacuna que está aumentando em nível de país e em toda a América Latina”, ilustrou a representante. Como uma história de sucesso, apresenta o impacto da nuvem digital em hospitais de terceiro nível no México, onde, por exemplo, milhões de dólares foram economizados ajudando os pacientes a evitar eventos adversos.
“A telemetria avançada permite que a atenção seja 83,6% mais rápida. Assim, o hospital tem um diferencial competitivo para gerar valor e não apenas um atendimento com foco em custos”, destacou Ardavin. Da mesma forma, considerando as estatísticas de que, no México, 19% das pessoas entre 30 e 69 anos morrem de doenças cardiovasculares, citou o trabalho conjunto com o Instituto Nacional de Cardiologia; a solução CardioEnlace, que permite o atendimento remoto personalizado de um cardiologista e é projetada para pacientes com problemas cardíacos.
A nuvem não é a única ferramenta que veio para ficar: a inteligência artificial (IA) já faz parte de alguns processos clínicos e “a saúde vai evoluir para a IA, gostemos ou não”, explica Gustavo Ross, Sócio de Healthcare e IA em Atomic 32. O especialista citou o projeto OMINIS, o Observatorio Mexicano para la Inteligencia y la Investigación en Salud, que é um mecanismo de busca onde estão centralizadas mais de mil fontes de dados monitoradas e suportadas, e que permite a integração de ferramentas de IA.
“Estamos vendo várias mudanças, como a passagem do consultório para a casa por meio da telemedicina; a evolução da evidência histórica para a evidência em tempo real; e diagnóstico assistido por IA, que permite ao especialista focar no que é importante; em estudos prioritários”, afirmou Ross, que sustenta que assim o diagnóstico final será mais eficiente e homogêneo.
Tanto Ross quanto o Dr. José Manuel Muñoz Moreno, Diretor Médico da Aidicare, concordaram com a importância da tecnologia e, especialmente, da IA para preencher as desigualdades geográficas no México. Nesse sentido, o Dr. Muñoz Moreno pediu a geração de soluções mais simples e baratas que facilitem a saúde personalizada para mais pessoas. Como exemplo, ele citou aplicativos de monitoramento remoto (como o da Aidicare), que permitem a captura de dados de um relógio Apple, um monitor de pressão arterial e outros instrumentos aprovados.
Estas soluções permitem medir, entre outras variáveis, glicose, oximetria, frequência cardíaca, horas de sono, temperatura, atividade física. “Todas as informações geradas pelo paciente em tempo real chegam ao seu médico, que recebe alertas em um painel e pode analisar tendências ou até mesmo diagnosticar patologias subestimadas”, explicou o Diretor Médico. Desta forma, o paciente recebe cuidados mais eficientes e, sobretudo, ajustados às suas necessidades.
Dê a vara e ensine a pescar
Todos os referentes presentes na conferência reconheceram que a capacitação é um aspecto fundamental para explorar todo o potencial das ferramentas digitais. Por isso, toda uma sessão foi dedicada à alfabetização digital e reuniu professores, pesquisadores e representantes das principais instituições de ensino. Representando a Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) e com base em sua experiência como professor de Informática Biomédica e na indústria da NTT DATA, o Dr. Samuel Gallegos enfatizou que as tecnologias digitais devem incluir a alfabetização para serem verdadeiramente eficientes. “A alfabetização digital em saúde depende de diversas variáveis de cada indivíduo e é importante que a pessoa não só tenha o conhecimento, mas também a capacidade de aplicá-lo. Tanto o paciente, quanto as instituições devem ter essas competências”, esclareceu.
Seu colega, Dr. Alejandro Alayola Sansores, chefe do Departamento de Informática Biomédica da Faculdade de Medicina da UNAM, enfatizou que a informática biomédica faz parte da transformação digital e está em constante mudança, ao contrário de outras disciplinas como a anatomia. Em sua apresentação, o Dr. Alayola discutiu casos preocupantes, como o de que, em 2017, apenas 24,7% das escolas de medicina incluíam o ensino de informática biomédica (IB). “Isso gera problemas como poucos desenvolvimentos da IA em saúde em nível de país, a ausência da IB em saúde ainda hoje em muitos currículos, a priorização da memória nas etapas formativas, ao invés do pensamento crítico e que a informática biomédica não é considerada um política estratégica nacional e regional no futuro imediato”, insistiu o especialista.
Outro problema apontado pela UNAM é que se considera que a IB vai substituir o médico ao invés de considerá-lo um potencializador de capacidade. “Os médicos não consideram a tecnologia como algo cotidiano; E por acaso eles não usam o buscador Google, recebem consultas pelo WhatsApp ou baixam material informativo em PDF? Então, eles já estão usando a tecnologia”, disse o Dr. Alayola. “A abordagem do ensino do IB na saúde deve ser baseada no raciocínio clínico. A saúde digital deve demonstrar os benefícios na clínica e é preciso evidenciar e sustentar que a IB não substitui o médico ou o pessoal de saúde”, frisou.
Em resposta a esses desafios, a proposta é criar uma disciplina digital de saúde obrigatória até 2026 em todas as escolas de saúde, além de:
- criar uma direção de saúde digital de caráter federal
- considerar a IB na saúde como elemento chave do desenvolvimento nacional
- adicionar um consultor de saúde digital em todas as unidades com mais de 60 funcionários
- promover a profissionalização de equipes em saúde digital
- promover desenvolvimentos próprios com abordagem regionalizada e multidisciplinar
- consideram que o mercado não é o inimigo, mas que pode haver círculos virtuosos
Crescer juntos
Do campo da prática privada, Humberto Javier Potes González, Diretor Geral do Consórcio Mexicano de Hospitais, que agrupa 52 instituições, também pediu às instituições que eduquem além do conhecimento clínico. Ele também disse que “novos sistemas devem ser implementados em infraestruturas que não sejam obsoletas e os modelos de atendimento mudem para focar na saúde e não na doença por meio de soluções digitais”.
Por sua vez, Rodrigo Saucedo, Líder de Saúde Digital da Fundação Carlos Slim, explicou que eles projetam soluções a partir do nível dos profissionais de saúde e depois aprofundam os desenvolvimentos. “Quando há convicção e determinação, as unidades de saúde podem acelerar a adoção de soluções digitais. A equipe está ansiosa para ter essas soluções.” Por isso, é importante capacitar os profissionais, mas também garantir a disponibilização de ferramentas que otimizem os processos e um planejamento adequado para que toda a organização possa avançar. “A pandemia foi o melhor exemplo da necessidade da tecnologia para garantir a continuidade do atendimento”, concluiu.
Por sua vez, Eduardo Verboonen Khoury, Diretor Geral Adjunto dos Hospitais MAC, disse que durante a pandemia eles assinaram o compromisso federal de receber pacientes do setor público, mas que não tiveram acesso ao prontuário eletrônico e tiveram que contar apenas com o que lhes relatou o paciente ou sua família. “Não é impossível, nos Estados Unidos o paciente já pode compartilhar parte ou todo seu prontuário eletrônico de forma ágil. Devemos dar pequenos passos, bases sólidas e depois, juntos, crescer em escala”, insistiu.
O Diretor dos Hospitais MAC também destacou que “todos os envolvidos no ecossistema devem fazer parte da mesa de negociações para promover um melhor atendimento” e Adriana García, Líder do Comitê de Saúde Digital da Associação Mexicana da Indústria de Tecnologia da Informação (AMITI) convocou incluir mais profissionais de saúde e seguradoras a este tipo de evento.
Assim como a representante da AMITI, a maioria dos palestrantes comemorou o compartilhamento de ideias no Summit organizado pela HIMSS e observou-se uma troca fluida entre os quase 300 assistentes virtuais no chat de cada painel. Mais uma prova de que a troca e a cooperação são a resposta aos desafios clínicos e tecnológicos que a transformação digital traz.
A gravação do HIMSS Mexico Executive Summit está disponível nos seguintes links: